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A ORQUESTRA ESTÁ DESAFINANDO


Publicitários são especialistas em sonhos, aspirações e esperanças. Eles seduzem as massas através de símbolos e manipulam com facilidade a credulidade humana. Através de suas técnicas, tudo se transforma em produto a ser consumido, inclusive, a política.
Em seu best seller “$ 29,99”, Frédéric Beigbeder mostra como funciona o poder de persuasão através dos falsos desejos do “homo consommatus”. Seu personagem principal, que encarna um publicitário como ele, afirma com sarcasmo: “Humm, é tão bom penetrar no cérebro de vocês. Gozo no hemisfério direito. O desejo não lhes pertence mais: imponho-lhes o meu. Proíbo-lhes de desejar ao acaso. Sou eu quem decide hoje o que vocês vão querer amanhã”.
Beigbeder não se furta em citar algumas frases de Joseph Goebbels: “O que buscamos não é a verdade, mas o efeito produzido”. “Quanto maior a mentira, mais ela passa”. Mas é o jovem e brilhante autor que, reconhecendo como técnicas de persuasão a dissimulação, o jeitinho e o humor, desfere um pensamento ainda mais sinistro: “O sistema atingiu seu objetivo: até a desobediência se tornou uma forma de obediência”. A essas alturas, pode-se indagar: haverá limite para tanto poder?
No Brasil não escapamos ao “totalitarismo” da propaganda. Pelo contrário. No comando do poder das ilusões políticas, o publicitário Duda Mendonça, que operou a metamorfose do perdedor de três eleições em vencedor sempre em campanha, é exímio manipulador de símbolos capazes de penetrar com força o inconsciente coletivo. Então Mendonça transformou o próprio presidente da República em símbolo. Mas como a simbologia é mutável, o presidente trocou o torno mecânico, de seu longínquo passado, pelo violino.
Alguém já disse que “o poder é como violino, se toma com a esquerda mas se toca com a direita”. De violinista o presidente evolui para maestro e simulou reger a orquestra-escola da Petrobrás. Muito interessante, pois seguindo o pensamento de Elias Canetti, em “Massa e Poder”, o maestro é o único que está de pé num plano elevado. Atrás de si se encontra a platéia, que emudece à sua chegada e o segue através do espetáculo que ele proporciona. O maestro é o guia e arrebata o público que o escuta embevecido. Todos estão ali para aplaudi-lo estrondosamente e sua aclamação se dará à medida de sua vitória. Seu exército de músicos obedecem aos gestos de sua mão e a obra executada é de natureza complexa. Cada integrante da orquestra é observado atentamente pelo maestro, que é o único que tem a partitura completa na cabeça. Ele ouve atentamente qualquer som errado e o corrige. Durante a execução da peça o mundo não pode ser outra coisa que não a peça, durante esse tempo o maestro é senhor do mundo.
Mas é certo que há um poder maior que controla a propaganda, ao qual a propaganda serve. O presidente pode simular reger a orquestra, mas ele é apenas o executor da obra. O compositor é outro, que quase não aparece, mas que em última instância é o grande poderoso. Entre nós, ninguém desconhece que seu nome é Zeus, perdão, Joseph Dirceu, o super-ministro que tem nas mãos o poder de nomear e demitir, de negociar privilégios e “comprar” votos no Congresso, de se impor pelo medo do castigo ou pela esperança da recompensa. Ele é, portanto, o autor da partitura, o grande timoneiro, o cérebro por trás da propaganda.
Haverá limite para tanto poder? A única brecha se abre quando a orquestra desafina, quando a harmonia entre os músicos se rompe e a platéia em vez de aplaudir, vaia. E a orquestra esta desafinando. Já existem músicos descontentes com a regência. O espetáculo não está tão belo assim, ainda que nos digam que está. O tempo irá demonstrar se nos resta algum desejo ou se estamos proibidos de desejar.

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