A Propriedade Fiduciária e o Novo Código Civil
O Novo Código Civil (Lei 10.406/2002) trouxe uma inovação a respeito da alienação fiduciária em garantia, ao regulamentar a propriedade fiduciária em seus arts. 1.361 a 1.368.
A alienação fiduciária em garantia de bens móveis, introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 4.728/65, conforme alterada pelo Decreto-lei 911/69, tem sido largamente utilizada como instrumento de garantia de financiamentos bancários, acentuadamente no financiamento de automóveis.
As características básicas do instituto da alienação fiduciária, estabelecidas pelo art. 66 da Lei 4728/65, são idênticas às da propriedade fiduciária. Trata-se, em ambos os casos, da transferência da propriedade resolúvel de bens móveis pelo devedor ao credor, como garantia de obrigações assumidas por aquele junto a este. Com a constituição da propriedade fiduciária ocorre ainda o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa, enquanto o credor permanece com a posse indireta da coisa.
Essa coincidência autoriza a interpretação de que o Novo Código Civil revogou tacitamente o art. 66 da Lei 4728/65, tendo regulado inteiramente a matéria da alienação fiduciária de bens móveis (a alienação fiduciária de imóveis, regulada pela Lei 9.514/97, permanece inalterada). Dessa forma, as expressões propriedade fiduciária e alienação fiduciária se confundem, podendo ser utilizadas indistintamente para designar o mesmo instituto jurídico. Uma vez admitida referida interpretação, deve-se ressalvar que os dispositivos processuais relacionados com a alienação fiduciária introduzidos pelo Decreto-lei 911/69 permanecem em vigor, de acordo com os termos do art. 2.043 do Novo Código Civil, o qual estabelece que permanecem em vigor as disposições processuais constantes de leis cujos preceitos de natureza civil tenham sido incorporados ao Novo Código Civil.
Apesar de ser muito utilizada nos financiamentos de bens de consumo, a alienação fiduciária também se configura como um importante instrumento de garantia nas operações de financiamento a empresas. No entanto, sua utilização em referidos financiamentos quando o credor não era uma instituição financeira nacional sofreu questionamentos nos tribunais com o passar dos anos.
Tendo em vista as vantagens oferecidas ao credor na alienação fiduciária, o STF acabou por determinar que esta somente poderia ser utilizada por instituições financeiras sujeitas à fiscalização do Banco Central do Brasil, o que limitava a utilização do instituto, inclusive nos casos de financiamentos concedidos por instituições estrangeiras.
Além disso, o parágrafo 1º do art. 66 da Lei 4728/65 estabelecia que o instrumento de constituição da alienação fiduciária devia ser registrado no domicílio do credor, o que seria impraticável caso referido credor fosse uma instituição com sede no exterior.
Na regulamentação dada pelo Novo Código Civil, a propriedade fiduciária pode ser livremente utilizada em quaisquer financiamentos, independentemente do credor ser brasileiro ou estrangeiro, tendo em vista que o Novo Código Civil é de aplicação genérica e não traz qualquer tipo de diferenciação ou restrição.
Devido as suas características básicas, a propriedade fiduciária possui algumas vantagens como garantia, influenciando, inclusive, na análise do risco de crédito da operação. Isso porque quando se utiliza a propriedade fiduciária para garantir uma dívida - seja em operações de empréstimo locais ou externas - o devedor transfere ao credor a propriedade, ainda que resolúvel, do bem objeto da garantia.
Caso ocorra o vencimento da dívida garantida pela propriedade fiduciária sem o devido pagamento por parte do devedor, o credor fica obrigado a vender, seja judicialmente ou de forma amigável, a coisa a terceiros, aplicando o preço no pagamento de seu crédito e das despesas por ele incorridas com sua cobrança, retornando o saldo, se houver, ao devedor.
Cumpre ressaltar que o Decreto-lei 911/69, ao alterar as disposições da Lei 4728/65 sobre a alienação fiduciária, assim dispõe com relação à falência do fiduciante: "Art. 7º: Na falência do devedor alienante, fica assegurado ao credor ou proprietário fiduciário o direito de pedir, na forma prevista na lei, a restituição do bem alienado fiduciariamente."
Assim, no caso de falência do devedor fiduciante, o credor fiduciário tem o direito de exigir a restituição dos bens objeto da alienação fiduciária. Nesse caso, o credor fiduciário não precisará habilitar seu crédito e aguardar o pagamento da dívida nos termos da Lei de Falências, mas sim solicitar a imediata restituição dos bens dados em garantia, para posteriormente vendê-los para saldar seu crédito.
A regulamentação da propriedade fiduciária pelo Novo Código Civil oferece assim uma modalidade de garantia vantajosa e interessante, cuja utilização não é limitada apenas às instituições financeiras nacionais, podendo ser utilizada em quaisquer operações financeiras, inclusive em operações com credores estrangeiros.
Autores: Ana Carolina de Salles Freire. Sócia na área de Mercado de Capitais e Direito Bancário de Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados.
Mateus Donato Gianeti. Advogado na área de Mercado de Capitais e Direito Bancário de Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados.
A alienação fiduciária em garantia de bens móveis, introduzida no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 4.728/65, conforme alterada pelo Decreto-lei 911/69, tem sido largamente utilizada como instrumento de garantia de financiamentos bancários, acentuadamente no financiamento de automóveis.
As características básicas do instituto da alienação fiduciária, estabelecidas pelo art. 66 da Lei 4728/65, são idênticas às da propriedade fiduciária. Trata-se, em ambos os casos, da transferência da propriedade resolúvel de bens móveis pelo devedor ao credor, como garantia de obrigações assumidas por aquele junto a este. Com a constituição da propriedade fiduciária ocorre ainda o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa, enquanto o credor permanece com a posse indireta da coisa.
Essa coincidência autoriza a interpretação de que o Novo Código Civil revogou tacitamente o art. 66 da Lei 4728/65, tendo regulado inteiramente a matéria da alienação fiduciária de bens móveis (a alienação fiduciária de imóveis, regulada pela Lei 9.514/97, permanece inalterada). Dessa forma, as expressões propriedade fiduciária e alienação fiduciária se confundem, podendo ser utilizadas indistintamente para designar o mesmo instituto jurídico. Uma vez admitida referida interpretação, deve-se ressalvar que os dispositivos processuais relacionados com a alienação fiduciária introduzidos pelo Decreto-lei 911/69 permanecem em vigor, de acordo com os termos do art. 2.043 do Novo Código Civil, o qual estabelece que permanecem em vigor as disposições processuais constantes de leis cujos preceitos de natureza civil tenham sido incorporados ao Novo Código Civil.
Apesar de ser muito utilizada nos financiamentos de bens de consumo, a alienação fiduciária também se configura como um importante instrumento de garantia nas operações de financiamento a empresas. No entanto, sua utilização em referidos financiamentos quando o credor não era uma instituição financeira nacional sofreu questionamentos nos tribunais com o passar dos anos.
Tendo em vista as vantagens oferecidas ao credor na alienação fiduciária, o STF acabou por determinar que esta somente poderia ser utilizada por instituições financeiras sujeitas à fiscalização do Banco Central do Brasil, o que limitava a utilização do instituto, inclusive nos casos de financiamentos concedidos por instituições estrangeiras.
Além disso, o parágrafo 1º do art. 66 da Lei 4728/65 estabelecia que o instrumento de constituição da alienação fiduciária devia ser registrado no domicílio do credor, o que seria impraticável caso referido credor fosse uma instituição com sede no exterior.
Na regulamentação dada pelo Novo Código Civil, a propriedade fiduciária pode ser livremente utilizada em quaisquer financiamentos, independentemente do credor ser brasileiro ou estrangeiro, tendo em vista que o Novo Código Civil é de aplicação genérica e não traz qualquer tipo de diferenciação ou restrição.
Devido as suas características básicas, a propriedade fiduciária possui algumas vantagens como garantia, influenciando, inclusive, na análise do risco de crédito da operação. Isso porque quando se utiliza a propriedade fiduciária para garantir uma dívida - seja em operações de empréstimo locais ou externas - o devedor transfere ao credor a propriedade, ainda que resolúvel, do bem objeto da garantia.
Caso ocorra o vencimento da dívida garantida pela propriedade fiduciária sem o devido pagamento por parte do devedor, o credor fica obrigado a vender, seja judicialmente ou de forma amigável, a coisa a terceiros, aplicando o preço no pagamento de seu crédito e das despesas por ele incorridas com sua cobrança, retornando o saldo, se houver, ao devedor.
Cumpre ressaltar que o Decreto-lei 911/69, ao alterar as disposições da Lei 4728/65 sobre a alienação fiduciária, assim dispõe com relação à falência do fiduciante: "Art. 7º: Na falência do devedor alienante, fica assegurado ao credor ou proprietário fiduciário o direito de pedir, na forma prevista na lei, a restituição do bem alienado fiduciariamente."
Assim, no caso de falência do devedor fiduciante, o credor fiduciário tem o direito de exigir a restituição dos bens objeto da alienação fiduciária. Nesse caso, o credor fiduciário não precisará habilitar seu crédito e aguardar o pagamento da dívida nos termos da Lei de Falências, mas sim solicitar a imediata restituição dos bens dados em garantia, para posteriormente vendê-los para saldar seu crédito.
A regulamentação da propriedade fiduciária pelo Novo Código Civil oferece assim uma modalidade de garantia vantajosa e interessante, cuja utilização não é limitada apenas às instituições financeiras nacionais, podendo ser utilizada em quaisquer operações financeiras, inclusive em operações com credores estrangeiros.
Autores: Ana Carolina de Salles Freire. Sócia na área de Mercado de Capitais e Direito Bancário de Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados.
Mateus Donato Gianeti. Advogado na área de Mercado de Capitais e Direito Bancário de Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados.