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Enunciado 22-FVC-IMN: plano coletivo de saúde - reajuste por sinistralidade - abusividade 08/01/2013

Enunciado 22-FVC-IMN: "É abusiva a cláusula inserida em contrato (plano) coletivo de assistência à saúde que permite o reajuste das mensalidades em função da 'sinistralidade".

Justificativa:

            A cláusula que prevê o recálculo do prêmio em função da sinistralidade, isto é, toda vez que o índice de sinistros pagos atingir determinado percentual, em função do prêmio cobrado em período imediatamente anterior (de três meses), autorizando a fazer o cálculo de novo prêmio, segundo fórmula prevista na mesma cláusula, é patentemente abusiva.
Com efeito, os direitos do segurado em contrato (plano) coletivo de assistência à saúde são praticamente idênticos àqueles decorrentes da contratação direta individual, resumindo-se no direito que ele tem de exigir o cumprimento das normas e condições pactuadas. Em termos de regulamentação, o plano coletivo de assistência à saúde encontra-se no mesmo plano das demais relações contratuais de consumo, no que diz respeito à aplicação das normas de proteção do consumidor, em especial o CDC. Trata-se de negócio jurídico em que uma das partes assume a obrigação de prestar serviços em favor de pessoa indicada pelo outro contratante (estipulante), mediante remuneração, enquadrando-se perfeitamente nos conceitos legais de consumidor e fornecedor (arts. 2o. e 3o. do CDC) - que definem a natureza da relação contratual de consumo. O segurado (beneficiário) é consumidor, pois utiliza os serviços na condição de destinatário final (art. 2o.), enquanto que a operadora do plano se enquadra na definição de fornecedor, uma vez que presta serviços (art. 3o.) de assistência à saúde (do segurado), sendo esses serviços prestados mediante remuneração (par. 2o. do art. 3o.). A forma da contratação, com a intermediação do estipulante, no intuito de criar o vínculo jurídico que liga a operadora aos segurados (consumidores), não descaracteriza a natureza consumerista do ajuste.


            Um efeito jurídico do enquadramento do plano coletivo de saúde na categoria de contrato de consumo tem a ver com a limitação dos reajustes, imposta no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). A operadora não pode reajustar unilateralmente os preços (as mensalidades) pagos pelos segurados, em razão da proibição contida no inc. X do art. 51 desse estatuto. Ainda que contratado de forma coletiva, por meio da intermediação de empresa que participa diretamente da negociação em favor de seus empregados ou associados, o contrato (plano) coletivo de saúde inclui-se na categoria dos contratos de consumo e, assim, está submetido ao regramento maior do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). Ainda que a agência reguladora que tem o papel de fiscalizar a atuação das operadoras de planos e seguros-saúde - a ANS - não tenha regulado estritamente a forma de reajuste desses contratos, eles não podem ser negociados ao arrepio da legislação e dos princípios de proteção do consumidor.
            Nesse sentido, a cláusula que permite o reajuste do prêmio em razão da sinistralidade viola a disposição contida no inc. X do art. 51 do CDC, que impede o fornecedor de reajustar unilateralmente os preços (as mensalidades) dos seus serviços. Com efeito, ao submeter o reajuste a fórmula de variação que não permite, ao segurado (consumidor), saber de antemão os seus ônus contratuais, a cláusula é atingida pela mácula da abusividade. É imprescindível que qualquer aumento contratualmente previsto seja veiculado através de fórmula claramente definida, de sorte a fornecer antecipadamente ao contratante que suporta a majoração dos valores uma perfeita noção dos ônus que lhe serão carreados em cada etapa contratual. Limitando-se simplesmente a remeter a fórmula, cujo resultado depende de dados elaborados e manipulados unilateralmente pela operadora, sem prévia definição do percentual do aumento, indiretamente entrega-se ao fornecedor (segurador) o poder de variação do preço contratual, sendo nula de pleno direito tal estipulação, nos termos do art. 51, X, do CDC.
Ainda outro argumento pode ser levantado contra a cláusula que prevê aumento em razão da "sinistralidade". Ela também pode ser considerada abusiva à luz do inc. IV do art. 51, igualmente do CDC, já que consagra vantagem exagerada para a seguradora. De fato, ao permitir que o preço do contrato possa ser reajustado sempre que houver um aumento na utilização dos serviços, a cláusula elimina a característica aleatória do contrato de seguro (plano) de saúde. Como se sabe, através do contrato de seguro o segurador assume a obrigação de garantir a outra parte (o segurado) contra os prejuízos resultantes de riscos futuros, previstos no instrumento contratual mas de acontecimento incerto. É esse evento futuro e incerto que o contrato de seguro garante que mostra sua característica aleatória. O segurado paga o prêmio e o segurador o recebe, ambos sem saber se o evento ocorrerá ou não. Se o segurador adquire o direito de se precaver, mediante aumento automático do prêmio, contra a ocorrência do evento futuro, desaparece a aleatoriedade do contrato. É o que acontece, na prática, com a adoção da cláusula de reajuste por "sinistralidade". Precavendo-se da eventualidade de ter que arcar com custos acima de um certo patamar, a operadora elimina a aleatoriedade do contrato em relação à sua pessoa, transferindo ônus que, em princípio seria seu, para a outra parte (o segurado). Todos os riscos, que são próprios da atividade securitária, são transferidos para a outra parte, o segurado. Como se vê, a par de criar vantagem exagerada para o fornecedor (operadora), por manter os custos de operação em patamar que lhe convenha (eliminada a aleatoriedade própria do contrato de seguro), a cláusula de reajuste baseada na "sinistralidade" também impõe à outra parte (o conjunto de beneficiários do plano) uma onerosidade excessiva, na medida em que a sujeita a aumentos aleatórios, desfigurando o objeto do contrato de seguro. Considerando a natureza e conteúdo do contrato de seguro, é imperativo reconhecer a patente abusividade da cláusula de reajuste em função da "sinistralidade".